Alguém nos disse o que é ser artista
Descobri o que é ser artista.
Alguém inspirador disse que os artistas o eram pela profunda e inabalável inquietude e insatisfação que lhes seriam eternamente intrínsecas. Pus-me a pensar que desde criança que sou inquieta em mim. Sou a calma aparente e corporal que serve de camuflagem para o turbilhão de ideias, desejos e visões que me assombram a cada minuto consciente.
De repente, sinto-me artista. A minha arte é a incógnita, pois é sempre na dúvida que me revejo enquanto ser multifacetado e sedento de criar. Quando duvido de quem sou, penso, idealizo e construo até mesmo o que não se materializa. Ah… O que não se materializa é tão bom, é o melhor! As minhas construções metafísicas são as minhas favoritas e, por vezes, ou melhor, muitas vezes, acontece-me desgostar das criações perceptíveis porque essas têm uma qualidade tangível e, como tal, medíocre quando comparada com a qualidade do que ninguém acessa.
Passou-me, neste instante, pela mente que talvez tenha chegado a uma resolução de extrema importância. Raras foram as vezes em que duvidei do meu intelecto mas ínfimas foram aquelas em que a situação foi embrulhada nesses mesmos filtros por ser o mais rapidamente compreendido e o caminho mais imediato para o colo que procurava. A minha revolta residia no mundo físico e no espelho material das minhas ideias e concepções e não na Origem dessas mesmas ideias e concepções. Eu revoltava-me com o mundo, com o pedaço de mundo incapaz de percecionar o belo que a minha mente via.
Confesso que me acontece ver o belo e reproduzir o hediondo, quase todas as vezes. Eu admito que a execução me falha, constantemente, e que as minhas mãos não se comportam como trabalhadores dignos de bónus mensal ou de elogios dos seus superiores.
Transpondo este revoltoso debate para dentro de mim, descubro que o maestro implacável desespera ao observar a mão de obra desqualificada e ignorante que tem ao seu dispor. E o feio que é quando estas três entidades se resolvem revoltar com quem vê, com quem nada tem que ver com o processo criativo, com o lado de fora!
Aí reside a ingratidão, o egocentrismo e o complexo de superioridade que me acusam de personificar. Eu prometo estar pronta para abandonar a cobardia e, daqui em diante, lidar comigo, em mim.
A escrita proporciona-me uma consciência crescente e penso que o encanto da minha se pode observar pelos inquietos afloramentos de conclusões, resoluções ou términos que me dão respostas e que cancelam desassossegos já muito antigos. Encanta-me que, hoje, escreva à procura das ideias e não das vírgulas esquecidas. Encanta-me, ainda, que escreva sem um objetivo delineado, sem plano de ação mas, sim, com instantâneos estímulos e renovados destinos. Encanta-me a forma como me confundo e esclareço de tanto divagar.
Talvez não seja esta a minha “arte”, mas foi nesta “arte” que descobri que sou artista.
Maria